Eu estava mesmo planejando essa postagem para o futuro. Mas como alguns amigos pediram, resolvi antecipar. Temas históricos normalmente são figura carimbada no cinema e nas séries televisivas. Uma pena que nem sempre essas adaptações conseguem captar o espírito da história que as inspirou. Em outros casos contudo, vê-se uma adaptação que extrapola a realidade, tornado aquela passagem histórica, no que define o gênero: Épica.
Não pretendo tratar de todos, porque isso seria simplesmente impossível. Há tantas séries e filmes épicos que daria para passar o ano inteiro só assistindo esse gênero e ainda assim, acredito, não seria possível ver todos. Vou tratar dos que vi e me marcaram profundamente a ponto de lembrar de cabeça.
Então vamos tentar seguir uma trajetória temporal.
Do fogo a luxuria
Não há melhor filme que retrate a pré-história do que "Quest for Fire" (Guerra do Fogo, no Brasil. Alias, infelizmente em nosso país tem-se o hábito de destruír o título e o sentido do título dos filmes épicos). É um ótimo filme que trata da difícil vida de homídeos, provavelmente Hilderbengensis (?!?!?!?!) ou Cro Magnon, que num ataque de Homo Erectus, perdem o seu bem mais precioso: O fogo. Sem o fogo, o grupo não tem como se defender do ambiente hostil da natureza de nosso planeta assassino e por isso eles decidem mandar três carinhas atrás do bem precioso (Porque eles não sabem fazer). Uma senhora aula de pré história. Recomendo sem ressalvas. Ainda mais pelo fato de que o filme nem precisa de legendas, porque não há diálogos, eles não sabem falar! É ótimo!
No que tange a antiguidade, não da para deixar de falar de algumas produções . Uma que considero de um primor histórico fantástico e as outras, bem nem tanto. Vamos começar pelas "outras".
Isso já foi motivo de discussão séria numa mesa de bar entre eu e um amigo, pois ele que é entendido de cinema me disse algo que realmente é verdade: "O cinema não pode ser históricamente correto, não pode nem deve. Pois é arte afinal, não ciência". Bom não foi exatamente isso que ele disse, mas foi o que entendi. De qualquer modo, vou descer a lenha mesmo assim. (Hehehe).
O filme em questão é 300. Na realidade o filme não é baseado na verídica batalha das Thermophilas, entre o exército persa do rei Xerxes e do grupo de soldados obstinados do grego Leonidas. O filme é baseado na História em Quadrinhos do Frank Miller, que por ventura é baseado na história original. Acontece que querendo ou não, a associação é inevitável. Especialmente para quem conhece o mito dos 300 de Esparta. E tudo naquele filme está fora do lugar. Mas, como disse meu amigo, ele não se propõe a contar a história da batalha e sim da HQ. Então é desculpavel.
O que não é desculpavel é Alexandre. Alexandre o Grande, recebeu esse título não só poque era um conquistador de impérios nato, mas porque era um homem brilhante para seu tempo. Ele, com um grupelho de bárbaros e mercenários conquistou o maior império de seu tempo e estendeu seus domínios até o que hoje é a Índia espalhando o helenismo (forma de pensar e viver dos gregos) para boa parte do mundo e fincando de vez o modo de vida ocidental nas raízes européias. Mas o que vemos no filme? Uma superexposição da sexualidade do homem, como se aquilo fosse o mais importante a se tratar. Homosexualidade na antiguidade não era tabu, nem pecado e muito menos mal visto. O sexo só passa a ter contornos de puritanismo após a Idade Média. Portanto, focar a imagem de uma das figuras mais importantes da história do ocidente a de um homosexual ressentido com a mãe é definitivamente uma idéia infeliz. Sem contar a lastimável atuação dos atores no filme. Collin Farrel como Alexandre é tão empolgante quanto a cena das espaçonaves se acoplando em 2001 uma Odisséia no Espaço. Ou seja, da sono.
Para salvar o período eis que surge o primor em forma de representação, a série Rome (Roma), da HBO. Utilizando uma abordagem de ficção histórica contemporânea para tratar de períodos importantes (onde normalmente os personagens principais não são grandes figuras históricas, mas que convivem com elas de um jeito ou de outro), nos faz mergulhar no mundo antigo com todas as suas vísceras expostas. Na clara intenção de chocar nossa careta sociedade, que se acha super liberal. Embora as atuações não sejam primorosas, o ambiente e as situações conseguem transpirar a antiguidade em sua face mais pura. Ainda que, com algumas passagens forçosamente jocosas que nos fazem, amar ou odiar personagens, tomando nossos valores como os corretos. Como por exemplo a última cena de Niobe, mulher de Lucius Vorenus.
Rei Arthur, também é um filme interessante, pois trata do conhecido e celebrado possível Arthur histórico e não o lendário Rei dos cavaleiros da Távola Redonda. Mostra uma Britania no início da invasão Saxã e da luta de colonos romanos e galeses contra o terrível invasor que invariavelmente os subjulgará e dará origem ao povo inglês. A Guinevere desse filme está mais para Boudica do que para a rainha de Arthur e amante de Lancelot.
Já chegando ao fim desse período histórico, sugiro um muito pouco conhecido, contudo, muito interessante filme chamado Átila, o Huno. Átila para quem não sabe, também conhecido por Espada de Marte ou Flagedo de Deus, foi o bárbaro que liderou um exército invaso e que por pouco não obliterou Roma do mapa. Ele foi derrotado pelo, possivelmente, último grande general Romano. É um filme muito bem feito, embora bastante simples e que mostra bem a decadência que o império estava em seus últmos dias.
"Das Cruzadas a América"
Ah o medievo. Todo mundo já ouviu falar mal dele. Querendo ou não é o definidor de nossa sociedade e temos que aceitar isso. A Idade Média nos moldou. Somos o seu retrato com alguns retoques e nada mais. E ninguém consegue retratar tão bem esse período quanto Umberto Eco. O Nome da Rosa é o filme definidor da Idade Média, um período obscuro e complicado, mas ao mesmo tempo brilhante e revelador para aqueles que aprendem a enxergar na penúmbra. Nem preciso dizer que a peça fundamental para o sucesso desse filme é a brilhante interpretação de Sean Conery.
Outro filme interessante é Kingdon of Heaven (Cruzada). Não pela acuidade histórica, porque não há nenhuma.Ou pelas intepretações memoráveis (Com excessão absoluta de Ghassan Massoud, cuja intepretação magistral de Saladin me encheu os olhos de lágrimas nas cenas finais), mas pela capacidade de retratar com certa fidelidade a fútil luta por aquele pedaço infeliz de terra que nada mais é do que um ideal. Robin Hood, o antigo (Aquele com Kevin Costner e Morgan Freeman) também é interessante, pela escolha de mostrar uma idade média dinâmica e não um periodo de estagnação, além de ser um filme engraçado.
Os diversos filmes sobre Joana D'arc também são interessantes. Embora tenham sempre a tendência de mostrá-la ora como uma louca psicótica ora como um santo instrumento de Deus (Vai depender de quem fez o filme, se anglófonos ou francófonos, hehehehe). Ainda aguardo um filme ou série da Dama de Lorraine que a mostre como uma mulher inteligente que soube manipular aqueles que estavam a sua volta para lhe dar o poder que acreditava precisar para tirar os franceses do atoleiro.
O 13º Guerreiro também é um filme interessante, que vai na mesma linha do Último Samurai. O estrangueiro que chega com um jeito diferente de ver o mundo e que acaba se descobrindo no convivio com o povo estranho que o "acolhe". A diferença é que Tom Cruise é integrado a refinada e tradicionalíssima cultura japonesa do século XIX, enquanto que Antonio Bandeiras vai para a última fronteira bárbara da Europa, os países nórdicos e seus hábitos e crenças nada requintados para seu tempo.
E finalmente, chegamos ao ápice do filme guerreiro medieval. Coração Valente. Todos já assistiram esse filme, dispensa comentários. Mel Gibson pode ser criticado pelo excesso de violência que aplica em seus filmes, mas de uma coisa não pode ser condenado. A de mascarar a brutalidade do mundo passado com eufemismos ou meias verdades. Sim, era uma prática, sobretudo na Grã Bretanha que os senhores medievais desposassem as mulheres recém casadas antes de seus maridos. Sim, as guerras eram sangrentas e cruéis e no turbilhão de aço e carne não existia heroísmo nenhum. Era só brutalidade e selvageria.
E por falar em Mel Gibson. Confesso que fiquei realmente impressionado com a ousadia dele em filmar Apocalypto. Conte nos dedos quantos filmes de América pré contato você conhece? Um que não esteja centrado no contato entre europeus e índios, mas sim no modo que os índios se relacionavam. Conhece mais algum? Parabéns. Mas garanto que não vão ser muitos. Ele foi criticado porque fez Paixão de Cristo fundamentalista. E tudo o que fizer de agora em diante vai ser criticado. Apocalypto é um excelente filme. Ok, o que transparece é que os índios, notadamente os Maias que são representados como opressores, são um bando de carniceiros malvados e sem escrúpulos. Mas ora, eles são cristãos? Eles conhecem direitos humanos? Não. Esse é o mundo em que morrer nas mãos do sacerdote é uma glória. E de que guerra por captura de escravos para o sacrifício é uma prática comum em quase todo o continente. Acontece que os cativos nem sempre encaravam assim. E foi isso que ele mostrou. A crítica é: o filme é anacrônico, sim, o apogeu da civilização Maia, como retratado no filme foi muito antes dos Europeus sonharem que existia América. A impressão que fica é que os Europeus salvam a pátria no final? Sim. Mas o resto, bem, o resto é puro deleite. Outro filme bom de América é o Último dos Moicanos. Mas o melhor deles é A Missão. Se nunca assistiu A Missão, vá correndo agora numa locadora mais próxima e alugue! Embora, esse seria o conselho que eu daria para alguém que se interessa por história das Américas.
Um filme para passar longe é Novo Mundo. Curiosamente também estrelado por Collin Farrel.... porque será? Porque o filme é um porre de chato. Evite! Evite a todo custo!
Mas nem tudo é guerra, afinal filme histórico não necessáriamente precisa ser épico de Guerra. Filmes como Orgulho e Preconceito, o Piano, Elizabeth, A Outra, etc. Que retratam as formas de relacionamento e o papel da mulher na sociedade reprimida dos séculos XIII ao XIX são ótimas pedidas para quem gosta de história e não quer ver alguém sendo decaptado ou ter o coração arrancado do peito ainda pulsante.
Há também as séries de Faroeste (Como a fantástica Deadwood), os filmes de segunda guerra mundial, normalmente todos muito bons (Nota 10 são a série Band of Brothers e os filmes a Queda e Circulo de Fogo, que trata da virada da segunda guerra mundial, a verdadeira virada. A Batalha de Stalingrado na Russia).
CORTA!
Bem amigos é isso.
Ficaram muitos filmes de fora dessa salada. Mas não dava para falar sobre todos. Muitos clássicos que abordam a Guerra Fria, como caçada ao Outubro Vermelho, ou o Dia em que a Terra Parou (O antigo) são exemplos desses. E há também os filmes que são pura diversão, mas com pitadas de história, como claro, não poderia deixar de ser, Indiana Jones (os três primeiros ok. Esse último não é Indiana Jones... Aliens!? Pelo amor de Deus...).
Diário da Reforma 4 - A obra
Há 9 anos