quarta-feira, 21 de julho de 2010

Luz... câmera... História!

Eu estava mesmo planejando essa postagem para o futuro. Mas como alguns amigos pediram, resolvi antecipar. Temas históricos normalmente são figura carimbada no cinema e nas séries televisivas. Uma pena que nem sempre essas adaptações conseguem captar o espírito da história que as inspirou. Em outros casos contudo, vê-se uma adaptação que extrapola a realidade, tornado aquela passagem histórica, no que define o gênero: Épica.
Não pretendo tratar de todos, porque isso seria simplesmente impossível. Há tantas séries e filmes épicos que daria para passar o ano inteiro só assistindo esse gênero e ainda assim, acredito, não seria possível ver todos. Vou tratar dos que vi e me marcaram profundamente a ponto de lembrar de cabeça.
Então vamos tentar seguir uma trajetória temporal.

Do fogo a luxuria

Não há melhor filme que retrate a pré-história do que "Quest for Fire" (Guerra do Fogo, no Brasil. Alias, infelizmente em nosso país tem-se o hábito de destruír o título e o sentido do título dos filmes épicos). É um ótimo filme que trata da difícil vida de homídeos, provavelmente Hilderbengensis (?!?!?!?!) ou Cro Magnon, que num ataque de Homo Erectus, perdem o seu bem mais precioso: O fogo. Sem o fogo, o grupo não tem como se defender do ambiente hostil da natureza de nosso planeta assassino e por isso eles decidem mandar três carinhas atrás do bem precioso (Porque eles não sabem fazer). Uma senhora aula de pré história. Recomendo sem ressalvas. Ainda mais pelo fato de que o filme nem precisa de legendas, porque não há diálogos, eles não sabem falar! É ótimo!

No que tange a antiguidade, não da para deixar de falar de algumas produções . Uma que considero de um primor histórico fantástico e as outras, bem nem tanto. Vamos começar pelas "outras".
Isso já foi motivo de discussão séria numa mesa de bar entre eu e um amigo, pois ele que é entendido de cinema me disse algo que realmente é verdade: "O cinema não pode ser históricamente correto, não pode nem deve. Pois é arte afinal, não ciência". Bom não foi exatamente isso que ele disse, mas foi o que entendi. De qualquer modo, vou descer a lenha mesmo assim. (Hehehe).
O filme em questão é 300. Na realidade o filme não é baseado na verídica batalha das Thermophilas, entre o exército persa do rei Xerxes e do grupo de soldados obstinados do grego Leonidas. O filme é baseado na História em Quadrinhos do Frank Miller, que por ventura é baseado na história original. Acontece que querendo ou não, a associação é inevitável. Especialmente para quem conhece o mito dos 300 de Esparta. E tudo naquele filme está fora do lugar. Mas, como disse meu amigo, ele não se propõe a contar a história da batalha e sim da HQ. Então é desculpavel.
O que não é desculpavel é Alexandre. Alexandre o Grande, recebeu esse título não só poque era um conquistador de impérios nato, mas porque era um homem brilhante para seu tempo. Ele, com um grupelho de bárbaros e mercenários conquistou o maior império de seu tempo e estendeu seus domínios até o que hoje é a Índia espalhando o helenismo (forma de pensar e viver dos gregos) para boa parte do mundo e fincando de vez o modo de vida ocidental nas raízes européias. Mas o que vemos no filme? Uma superexposição da sexualidade do homem, como se aquilo fosse o mais importante a se tratar. Homosexualidade na antiguidade não era tabu, nem pecado e muito menos mal visto. O sexo só passa a ter contornos de puritanismo após a Idade Média. Portanto, focar a imagem de uma das figuras mais importantes da história do ocidente a de um homosexual ressentido com a mãe é definitivamente uma idéia infeliz. Sem contar a lastimável atuação dos atores no filme. Collin Farrel como Alexandre é tão empolgante quanto a cena das espaçonaves se acoplando em 2001 uma Odisséia no Espaço. Ou seja, da sono.
Para salvar o período eis que surge o primor em forma de representação, a série Rome (Roma), da HBO. Utilizando uma abordagem de ficção histórica contemporânea para tratar de períodos importantes (onde normalmente os personagens principais não são grandes figuras históricas, mas que convivem com elas de um jeito ou de outro), nos faz mergulhar no mundo antigo com todas as suas vísceras expostas. Na clara intenção de chocar nossa careta sociedade, que se acha super liberal. Embora as atuações não sejam primorosas, o ambiente e as situações conseguem transpirar a antiguidade em sua face mais pura. Ainda que, com algumas passagens forçosamente jocosas que nos fazem, amar ou odiar personagens, tomando nossos valores como os corretos. Como por exemplo a última cena de Niobe, mulher de Lucius Vorenus.
Rei Arthur, também é um filme interessante, pois trata do conhecido e celebrado possível Arthur histórico e não o lendário Rei dos cavaleiros da Távola Redonda. Mostra uma Britania no início da invasão Saxã e da luta de colonos romanos e galeses contra o terrível invasor que invariavelmente os subjulgará e dará origem ao povo inglês. A Guinevere desse filme está mais para Boudica do que para a rainha de Arthur e amante de Lancelot.

Já chegando ao fim desse período histórico, sugiro um muito pouco conhecido, contudo, muito interessante filme chamado Átila, o Huno. Átila para quem não sabe, também conhecido por Espada de Marte ou Flagedo de Deus, foi o bárbaro que liderou um exército invaso e que por pouco não obliterou Roma do mapa. Ele foi derrotado pelo, possivelmente, último grande general Romano. É um filme muito bem feito, embora bastante simples e que mostra bem a decadência que o império estava em seus últmos dias.




"Das Cruzadas a América"

Ah o medievo. Todo mundo já ouviu falar mal dele. Querendo ou não é o definidor de nossa sociedade e temos que aceitar isso. A Idade Média nos moldou. Somos o seu retrato com alguns retoques e nada mais. E ninguém consegue retratar tão bem esse período quanto Umberto Eco. O Nome da Rosa é o filme definidor da Idade Média, um período obscuro e complicado, mas ao mesmo tempo brilhante e revelador para aqueles que aprendem a enxergar na penúmbra. Nem preciso dizer que a peça fundamental para o sucesso desse filme é a brilhante interpretação de Sean Conery.
Outro filme interessante é Kingdon of Heaven (Cruzada). Não pela acuidade histórica, porque não há nenhuma.Ou pelas intepretações memoráveis (Com excessão absoluta de Ghassan Massoud, cuja intepretação magistral de Saladin me encheu os olhos de lágrimas nas cenas finais), mas pela capacidade de retratar com certa fidelidade a fútil luta por aquele pedaço infeliz de terra que nada mais é do que um ideal. Robin Hood, o antigo (Aquele com Kevin Costner e Morgan Freeman) também é interessante, pela escolha de mostrar uma idade média dinâmica e não um periodo de estagnação, além de ser um filme engraçado.
Os diversos filmes sobre Joana D'arc também são interessantes. Embora tenham sempre a tendência de mostrá-la ora como uma louca psicótica ora como um santo instrumento de Deus (Vai depender de quem fez o filme, se anglófonos ou francófonos, hehehehe). Ainda aguardo um filme ou série da Dama de Lorraine que a mostre como uma mulher inteligente que soube manipular aqueles que estavam a sua volta para lhe dar o poder que acreditava precisar para tirar os franceses do atoleiro.
O 13º Guerreiro também é um filme interessante, que vai na mesma linha do Último Samurai. O estrangueiro que chega com um jeito diferente de ver o mundo e que acaba se descobrindo no convivio com o povo estranho que o "acolhe". A diferença é que Tom Cruise é integrado a refinada e tradicionalíssima cultura japonesa do século XIX, enquanto que Antonio Bandeiras vai para a última fronteira bárbara da Europa, os países nórdicos e seus hábitos e crenças nada requintados para seu tempo.

E finalmente, chegamos ao ápice do filme guerreiro medieval. Coração Valente. Todos já assistiram esse filme, dispensa comentários. Mel Gibson pode ser criticado pelo excesso de violência que aplica em seus filmes, mas de uma coisa não pode ser condenado. A de mascarar a brutalidade do mundo passado com eufemismos ou meias verdades. Sim, era uma prática, sobretudo na Grã Bretanha que os senhores medievais desposassem as mulheres recém casadas antes de seus maridos. Sim, as guerras eram sangrentas e cruéis e no turbilhão de aço e carne não existia heroísmo nenhum. Era só brutalidade e selvageria.
E por falar em Mel Gibson. Confesso que fiquei realmente impressionado com a ousadia dele em filmar Apocalypto. Conte nos dedos quantos filmes de América pré contato você conhece? Um que não esteja centrado no contato entre europeus e índios, mas sim no modo que os índios se relacionavam. Conhece mais algum? Parabéns. Mas garanto que não vão ser muitos. Ele foi criticado porque fez Paixão de Cristo fundamentalista. E tudo o que fizer de agora em diante vai ser criticado. Apocalypto é um excelente filme. Ok, o que transparece é que os índios, notadamente os Maias que são representados como opressores, são um bando de carniceiros malvados e sem escrúpulos. Mas ora, eles são cristãos? Eles conhecem direitos humanos? Não. Esse é o mundo em que morrer nas mãos do sacerdote é uma glória. E de que guerra por captura de escravos para o sacrifício é uma prática comum em quase todo o continente. Acontece que os cativos nem sempre encaravam assim. E foi isso que ele mostrou. A crítica é: o filme é anacrônico, sim, o apogeu da civilização Maia, como retratado no filme foi muito antes dos Europeus sonharem que existia América. A impressão que fica é que os Europeus salvam a pátria no final? Sim. Mas o resto, bem, o resto é puro deleite. Outro filme bom de América é o Último dos Moicanos. Mas o melhor deles é A Missão. Se nunca assistiu A Missão, vá correndo agora numa locadora mais próxima e alugue! Embora, esse seria o conselho que eu daria para alguém que se interessa por história das Américas.
Um filme para passar longe é Novo Mundo. Curiosamente também estrelado por Collin Farrel.... porque será? Porque o filme é um porre de chato. Evite! Evite a todo custo!
Mas nem tudo é guerra, afinal filme histórico não necessáriamente precisa ser épico de Guerra. Filmes como Orgulho e Preconceito, o Piano, Elizabeth, A Outra, etc. Que retratam as formas de relacionamento e o papel da mulher na sociedade reprimida dos séculos XIII ao XIX são ótimas pedidas para quem gosta de história e não quer ver alguém sendo decaptado ou ter o coração arrancado do peito ainda pulsante.
Há também as séries de Faroeste (Como a fantástica Deadwood), os filmes de segunda guerra mundial, normalmente todos muito bons (Nota 10 são a série Band of Brothers e os filmes a Queda e Circulo de Fogo, que trata da virada da segunda guerra mundial, a verdadeira virada. A Batalha de Stalingrado na Russia).

CORTA!

Bem amigos é isso.
Ficaram muitos filmes de fora dessa salada. Mas não dava para falar sobre todos. Muitos clássicos que abordam a Guerra Fria, como caçada ao Outubro Vermelho, ou o Dia em que a Terra Parou (O antigo) são exemplos desses. E há também os filmes que são pura diversão, mas com pitadas de história, como claro, não poderia deixar de ser, Indiana Jones (os três primeiros ok. Esse último não é Indiana Jones... Aliens!? Pelo amor de Deus...).


 

terça-feira, 13 de julho de 2010

Olé!

Olá leitores.
Bem, eu prometi semanas atrás a um amigo que gosta de me ouvir falar de história que falaria de um país muito importante para ele. E aproveitando o ensejo do fim da copa vou pagar a promessa.
Apesar de gostar de escrever um bocado, como vocês já devem ter percebido, vou ter de me furtar de vários aspectos da história desse país, porque ela é extensa e importante demais para ser contada de uma única vez. Assim, vou me ater aos pontos mais importantes e quem sabe numa outra ocasião abordar outros pontos da história.
Entonces, !!vamos a la España!!

Tierra de Conejos

A Península Ibérica (aquele pedaço de terra que se projeta da Europa para o Atlântico, que compõe hoje Portugal e Espanha) é habitada pelos homens há muito tempo. Mas a história desse pedaço de terra passa a ter importância para nós a partir da chegada de Gregos e Fenícios (Que se originavam onde hoje é o Líbano e cuja capital mais importante foi Cartago, onde hoje é a Líbia, no norte da África) a região. Foram os Gregos que deram o nome a península. Os Fenícios fundaram Cadiz (80 anos depois da Guerra de Troia) e foi deles que o país ganhou seu nome. Eles o chamaram de i-spn-ya. O real significado dessa palavra é controvérso. Mas a teoria mais aceita é que o nome signifique "Terra de muitos coelhos". Assim, se um dia for a Espanha, evite piadinhas envolvendo coelhos, os espanhóis tendem a não gostar muito delas, hehehe. Bem, depois que os romanos derrotaram Cartago nas Guerra Púnicas (Duas grandes guerras envolvendo o nascente poder romano e o poderoso império marítimo fenício) a Península Ibérica como um todo passou a fazer parte do Império Romano e isso lhe trouxe grande prestígio. Tanto que três imperadores romanos (Trajano, Adriano e Teodosio) e um grande filósofo da Antiguidade (Seneca) nasceram no que hoje seria a Espanha.
A prosperidade da região durou tanto quanto o Império Romano Ocidental. Quando esse começou a ruir, ruíram também as proteções dos hispanicos. Assim, os bárbaros invadiram a península e fizeram o mesmo que fizeram em toda a Europa Ocidental. Derrubaram Roma e tudo aquilo que a fazia prosperar, mergulhando assim na Idade Média. Triste fim para Roma, mas essas invasões foram responsáveis pelo período que definiria nossa sociedade como um todo e que caracterizaria principalmente o modo de ver o mundo dos espanhóis. Assim a tão mal falada idade média é de suma importância, embora de fato tenha lançado nossos ancestrais europeus séculos atrás nos avanços científicos que os romanos e gregos haviam adquirido.

Mouros!
Dos bárbaros invasores, o povo que melhor se adaptou a hispania foram os Visigodos. Os Visigodos, assim como todos os demais povos "Bárbaros" invadores do Império Romano vinham do norte e leste da Europa ou da Ásia. Notadamente do que hoje chamariamos de Alemanha, Hungria, Bulgária, etc. Os Visigodos derrotaram os outros bárbaros da região e tomaram as rédeas da península. Foram os primeiros a unificar os territórios em torno de um monarca e acabaram aceitando o cristianismo como religião oficial (Alias, marco importante não só para os espanhóis mas para toda a Europa. O Cristianismo acabou se tornando a liga principal de toda essa salada de povos para o grande invasor que estava por vir). O primeiro centro de poder da Hispania foi a cidade de Toletum (Hoje Toledo).

Tudo ia bem para os Visigodos até a chegada de um novo terrível adversário. Impulsionados pela fé e pelas conquistas sucessivas e incontestáveis, os árabes chegaram a península e rapidamente conquistaram os reinos Visigodos, forçando-os cada vez mais ao norte e assim tomando toda a região sul da Espanha e de Portugal. E aqui vale uma ironia. Durante a Idade das Trevas na Europa, os Árabes ascenderam ao poder no que antes era um domínio absoluto do Império Romano. Conquistaram terras importantes como o Egíto e a Pérsia, o Magreb (Norte da África) e invadiram a Europa sem piedade, para levar a "verdadeira fé" aos povos bárbaros do norte. Os muçulmanos naquele período eram um dos povos mais avançados do mundo. Construíram a primeira universidade em solo europeu (Em Córdoba)e ajudaram a difundir conceitos matemáticos avançados, como o Zero (Palavra árabe), que eles aprenderam com os Hindus. Os árabes fundaram Córdoba e criaram o emirado de Al-Andaluz. Foram contidos por Carlos Magno em sua louca investida para o norte da Europa e se contentaram em dominar mais da metade do território ibérico.
Sobrou para os cristãos apenas uma estreita faixa no norte da península, que abrigava as regiões de Leão, Castela, Galícia e o País Basco, cujo povo já habitava a mesma terra antes mesmo dos Fenícios chegarem e ficaram ali, teimosos todo esse tempo, impressionante a disposição dos Bascos em se afirmar como povo independente, sofrendo invasões de toda a sorte desde 2000 a.C.
Os reis visigodos que quiseram manter seus reinos tiveram de converter-se ao Islamismo, aqueles que não o fizeram foram mortos ou expulsos e assim parecia que a Espanha seria definitivamente muçulmana, não fosse o fanatismo religioso que abrigou-se no coração dos povos que habitavam aquela estreita faixa de terra ao norte da península.
Essa resistência ganhou força moral quando o Rei Pelayo, se revoltou contra os muçulmanos. A primeira revolta fracassou e não deu em nada. Mas ele não desistiu, fez novamente e dessa vez acabou conseguindo a independência de seu reino, que passou a se chamar Reino das Astúrias. Esse é o marco importante e principal do que será conhecido como "La Reconquista".
Do lado mais oriental da península, que era controlada tanto por Francos (Povos bárbaros como os Visigodos que se estabeleceram na Galia, atual França, e cujo nome do atual País que o ocupa veio deles) quanto por Visigodos a expansão muçulmana foi detida pelos Reis Carolingios, dos quais o mais famoso é Carlos Magno. O esquema utilizado por eles para frear os árabes era transformar regiões inteiras em condados militares, fortemente armados e semi-independentes (quase feudos) para se defenderem do invasor com tudo o que tinham. Esses condados acabaram com o tempo se dissociando cada vez mais do poder central dos Carolingios e ganhando cada vez mais autonomia. Eram conhecidos como Marca Hispanhola ou Condados de Barcelona, ou Cataluña. Esses condados logo começaram a se expandir, formando alianças por casamentou ou conquistando novos territórios (De mouros ou cristãos, não importava). Por volta do século XII os condados se uniram a Coroa de Aragão, formando uma frente considerável aos mouros.
Portanto, pode parecer uma ironia, mas sem dúvida, a invasão muçulmana à Península Ibérica foi a principal responsável pela união dos povos que viviam na Hispania em torno de um único objetivo, forjando assim o que no futuro seria a identidade nacional espanhola.
Contudo há uma lenda que explica melhor esse assunto.

"El Cid"

Diz-se que por volta de 1041 d.C. nasceu na Região de Castilla y Leão, na província de Burgos, na cidade de Vivar del Cid um tal Rodrigo Diaz de Vivar. Ele era filho de um nobre, proprietário de vastas terras na região onde vivia. Rodrigo logo ingressou na área militar, tornando-se pajem do principe Sancho, filho de Fernando I de Leão y Castilla.
Por conta disso, aprendeu a lutar, a ler e escrever (um tremendo privilégio no século XI) e também algumas noções de direito. Contudo, foi nas armas que ele se destacou de fato. O Rei Fernando I morreu e dividiu o seu reino entre os filhos da seguinte forma: Castilla para Sancho, Leão para Afonso, Galicia para Garcia, Toro para Elvira e Zamora para Urraca (Isso era nome de mulher na época). Foi feito cavaleiro pelo Rei Sancho II de Castilla. Rodrigo ajudou o jovem rei a tomar de seus irmãos os reinos de Toro, Leão e da Galicia. E foi durante essas lutas que ele ganhou seu primeiro apelido, "Campeador", após derrotar um Alferes (Uma patente militar que já não existe mais nos exércitos modernos, mas que ficaria entre o sargento e o tenente)em um duelo.
Durante o cerco de Zamora, em que Rodrigo estava presente, o Rei Sancho foi assassinado. Rodrigo então prestou juramento ao irmão derrotado de Sancho, Afonso I de Leão, que conseguiu unificar os reinos novamente. Contudo, diz a lenda, que ele só fez isso depois de obrigar o novo rei a prestar "Juramento de Santa Gadea", isentando-se de qualquer participação no assassinato de seu irmão Sancho.
Rodrigo e Afonso tiveram um período de boas relações, o rei inclusive arranjou o casamento de Rodrigo com Jimena Diaz, o único amor do herói espanhol. Jimena era da alta nobreza espanhola e teve três filhos com Rodrigo, sendo um menino e duas meninas. As garotas se casariam com figurões da história espanhola.
Afonso, porém, entregou a Rodrigo um papel secundário nos assuntos do estado. Rodrigo agora era um cobrador de tributos dos reinos mouros que pagavam impostos ao Rei para serem deixados em paz. E foi numa dessas cobranças que as coisas começaram a se complicar para o Campeador.
Rodrigo seguiu com seus homens ao reino do califa Almutamid em Sevilla para cobrar a pária, o tal imposto citado acima, quando se viu diante de um conflito. Um nobre espanhol, Garcia Ordonez a serviço do rei Abdala de Granada estava atacando Sevilla e Almutamid pediu ajuda a Rodrigo. Como Sevilla era tributária do Rei Afonso, Rodrigo e seus homens lutaram a seu favor e venceram o conflito. Mas isso custaria caro para ele. Os nobres cristãos, enciumados com o prestígio do Campeador e com o fato dele ter lutado contra um irmão de fé a favor de um mouro infiél instigaram o Rei a tomar uma atitude drástica. Rodrigo seria desterrado, tornado um soldado sem senhor, um cavaleiro errante e obrigado a viver fora dos domínios cristãos.
E é aqui que ele deixa de ser um homem e se torna uma lenda.

Não há nada mais desonroso para um cavaleiro no século XI do que não ter um senhor. Alias, nada mais desonroso e mortal. Afinal, um cavaleiro nada é se não um soldado a serviço de um senhor. E é esse senhor que lhe provém o sustento e a segurança do cavaleiro e de sua família. Ser portanto um degredado, um exilado ou um cavaleiro errante é ser pior do que um mendigo. É estar a um passo do banditismo ou da sepultura.
Portanto, Rodrigo não poderia se resignar a errar por ai, livre, leve e solto. Ele precisava de um senhor, mas nenhum rei cristão aceitava lhe dar abrigo, temendo a ira do grande Afonso. Assim, o Campeador não teve outra saída se não recorrer aqueles contra quem ele lutou tão bravamente. Rodrigo Diaz de Vivar tornou-se um cavaleiro a serviço dos muçulmanos.
Os muçulmanos conheciam Rodrigo pelo apelido de El Cid. Apelido esse que será a marca de sua lenda. El Cid tornou-se cavaleiro do rei de Zaragossa Al-Muqtadir e depois de seu filhho Al-Mutaman. Sua primeira missão foi derrotar um dos irmãos de Al-Mutaman, que se aliara aos condes de Barcelona e ao Rei Afonso contra Zaragossa. El Cid venceu a batalha e fez um dos condes refém. Sua fama se espalhou como uma centelha nos califados muçulmanos e todos desejavam ter aquele brilhante guerreiro a seus serviços.
Os Mouros que habitavam a península na época eram bastante diferentes dos demais muçulmanos que habitavam o resto do vasto império árabe. Por conta da proximidade com os reinos cristãos e portanto, com cristãos em suas terras, os muçulmanos da hispania tiveram de fazer vista grossa a alguns preceitos do islamismo. Portanto, não eram fundamentalistas.
Mas como todos os povos de seu tempo, os muçulmanos também tinha rixas internas. Por volta de 1086 um grupo de guerreiros mouros, os Almoravidas, invadiram a península ibérica, trazendo consigo uma observância maior da lei islâmica, que era totalmente incompatível com a idéia de ter um chefe de guerra cristão trabalhando como um mercenário. Os Almoravidas, como invasores, também traziam homens ávidos por enriquecimento rápido e portanto eram uma ameaça substancial tanto para mouros quanto para cristãos. Eles desequilibraram o status quo da península e fizeram com que os cristãos passassem a temer uma nova onda de ataques e saques de suas terras. Numa tentativa de impedir que continuassem avançando, Afonso envia seus exércitos a Sargrajas, onde é derrotado.
O Rei então fez as pazes com El Cid e juntos eles conseguiram deter os Almoravidas. Rodrigo ganhou poder e prestígio, mas isso não durou muito. Novos conflitos entre os califas mouros que mantiveram seus reinos e os cristãos acabaram forçando o rei Afonso a intervir novamente. Ele solicitou a ajuda de El Cid, que não apareceu para ajudá-lo. O motivo é incerto, provavelmente Rodrigo não conseguiu chegar, ou então quis evitar um confronto entre dois senhores que ele servira e de quem gostava. Assim, incorreu na fúria de seu rei e foi desterrado, pela segunda vez.

Contudo agora Rodrigo não era só um cavaleiro errante. Ele era El Cid Campeador. Centenas de cavaleiros o seguiam por sua glória e ele passou a agir por conta própria, conseguindo vitórias fantásticas sobre os adversários e tornando-se um grandioso senhor de terras em toda região leste da hispania. Afonso percebendo que estava sendo isolado pelo poder do Cid aliou-se aos condes de Barcelona e Aragão e atacou as forças de Cid, assediando Valencia onde ele se instalara. Mas foram rechaçados e expulsos das terras de Rodrigo.
Ele ergueu um reino poderoso em Valencia, que durou até sua morte. Jimena e seu genro Ramon Berenger III (Conde de Barcelona) tentaram manter o poder, mas foram expulsos pelos almorávidas e receberam abrigo do Rei Afonso.

Contudo isso é a história oficial. O mito de El Cid termina, como toda história épica deve terminar.
Ferido gravemente durante o cerco almoravida a Valência, El Cid em seus últimos minutos de vida pede a sua esposa que lhe conceda um último desejo. Que ele possa cavalgar junto com seu rei uma última vez contra seus inimigos. Mas ele não passaria daquela noite.
Jimena, juntamente com o genro de Rodrigo então tem uma idéia. Os homens de El Cid não poderiam suspeitar que ele estava morto ou moral das tropas despencaria e o impeto da luta estaria acabado. Assim, naquela noite eles amarraram o Campeador ao seu cavalo e usando algumas estruturas de madeira mantiveram o cadaver em posição altiva, com a lança em riste. Momentos antes da batalha começar bateram nas ancas do cavalo do Cid e o lançaram a toda carga sobre a infantaria almoravida, muito mais numerosa. 
Os Almoravidas que já cantavam vitória acreditando que o homem estava morto assustaram-se com aquela aparição e fugiram assustados. Os homens do Cid, inflados pelo orgulho e pela coragem de seu senhor, que partia para a batalha como se não houvesse amanhã (No caso dele, não mesmo!) o seguiram e massacraram os almoravidas. E graças a esse ato desesperado, os cristãos venceram o cerco de Valencia e El Cid foi consagrado o maior herói que a espanha já teve.
Ele é o exemplo máximo do espírito espanhol. De fé, oportunismo e honra. Celebrado herói dos castelhanos. E inspiração da luta pela reconquista cristã da Península Ibérica, que seria tratada como uma verdadeira cruzada ocidental, para expulsar os muçulmanos da Europa e que se concretizaria somente no século XV, sob o reinado de Fernando de Aragão e Isabel de Castilla (De quem já falei aqui no Blog). Que iniciaram um dos primeiros estado nação do mundo. A Espanha.

Apenas o começo...

A Reconquista marca o início da ascensão espanhola ao topo do mundo. Com a unificação dos reinos nas mãos dos Reis Católicos (Fernando e Isabela) o feudalismo chegava ao fim na Espanha e a Idade Moderna começava a despontar em solo Ibérico. Foi durante o fim da idade média e o início da idade moderna que Portugal e Espanha alcançaram o auge de seu poder. Notadamente porque seus reis perceberam o ambiente favorável para por fim ao regime feudal e concentrar o poder em suas mãos. Sua desculpa foi a reconquista e a expulsão dos mouros de seu território.
Posteriormente a Espanha tropeçaria na América, dividiria o mundo com Portugal e dominaria o mundo num império em que o Sol jamais se punha. Contudo aquilo que uniu os espanhóis para a glória possivelmente os levou a ruína. A religiosidade exacerbada e fanática dos espanhóis nos séculos XVII e XVIII levou a Espanha a conflitos com quase todos os seus vizinhos. França, Holanda, etc. E claro, com sua arquirival, a Inglaterra de Elizabeth, que suplantará a Espanha nos séculos vindouros como a grande potência marítima, econômica e política do continente Europeu até a Primeira Guerra Mundial. As razões para esse declinio tão acentuado de uma nação tão onipotente em seu tempo é motivo de discussão no meio acadêmico, mas atribiu-se principalmente a prática religiosa e ao pensamento retrógrado dos governantes Espanhóis, que sustentados pelas riquezas de suas colônias na América, não acompanharam as evoluções econômicas, tecnológicas e sociais que o resto do continente enfrentava. A prata das Américas, foi a glória e a ruína de Espanha.