terça-feira, 17 de agosto de 2010

Bon Appetti!

Bom promessa é dívida!
Minha esposa é uma entusiasta da história culinária e vem me cobrando um post a respeito dessa importante característica humana a um bom tempo. Então resolvi fazer uma ode a mesa ao mesmo tempo em que tento lhes mostrar porque a culinária é sem dúvida uma das artes mais exóticas (E delíciosas!) que a humanidade já criou.
Então, caneta e bloquinho nas mãos! Vamos a receita!

Ingredientes, receitas e culturas.

Tudo começa por eles é claro. O que seria do bolo sem farinha?
Os primeiros ingredientes claro, foram fornecidos aos nossos antepassados pela natureza. Com certeza no começo pouco importava o gosto ou a harmonia, afinal quem tem fome come o que tiver na frente. Mas conforme os lobos e leões foram ficando distantes nossos antepassados puderam se dedicar a entender porque alguns alimentos eram melhores se misturados com aqueles outros do que com aqueles acolá. E voalá, inventaram a cozinha.
É complicado falar numa "primeira civilização", pois tem-se a idéia errônea de acreditar que sendo assim a civilização irradiou para todo o resto a partir dela. Mas credita-se aos Sumérios, povo que habitava a Mesopotâmia (Que hoje atende pelo singelo nome de Iraque, acretido que dispense apresentações) uma das principais "invenções" do mundo antigo. Que marca a passagem da "pré-história" para a Antiguidade, ou seja, a Escrita. Embora os sumérios não tivessem uma escrita elaborada como a nossa (Eles não escreveriam blogs! Com risquinhos) ela os ajudou a se organizar melhor. Os sumérios já bebiam cerveja e já faziam queijo a aproximadamente 3000 a.C. Há inclusive algumas receitas do que eles costumavam comer, como a Torta mista abaixo:


Torta Mista


Ingredientes: Farinha, água, leite ou cerveja, azeite, frutas secas (passas, figos, maçãs, pessegos) e pinhões, condimentos aromáticos (cominho e mostarda) mel e alho.


A torta deve ser assada no forno e os frutos secos devem ser umedecidos em um tipo de licor qualquer (de preferência de arroz). A qualquer momento que o cozinheiro quiser pode acrescentar o mel, como bem entender (Eles não faziam questão de elaborar receitas pré programadas, até porque não tinham como fazer isso, não existia alfabeto na época e a escrita era precária).

Isso ai claro era acompanhado de muita cerveja (Quente!) e muita carne de carneiro, e principalmente, pescado. Afinal, os sumérios viviam no encontro de dois importantes rios, os famosos Tigre e Eufrates.

Ok! Ok. O povo há 5000 anos manjava de fazer torta e cerveja quente.
Bom, um pouco mais que isso.
Minha esposa adora pães. Nunca vi alguém gostar tanto de pão como ela. Bom, o pão foi inventado por outra civilização da antiguidade. Os famosos Egípcios. E não só os pães, mas a Pizza também. Alias, para quem não sabe, a palavra Pizza vem de Piscea. Que em grego antigo significava forno antigo, mas que também era o nome do pão que os povos que habitavam o crescente fértil faziam, muito parecido com o pão sírio de hoje.

E já que estamos falando de culinária mediterrânea, como deixar de lado os Gregos?
A culinária grega ao contrário do que pode se pensar, por ser um povo voltado para o mar, não é baseada em frutos do mar nem pescado. Em sua maioria os pratos são basicamente de alimentos cultivados em terra e o azeite sem dúvida o ingrediente mais importante. E claro, estamos falando de gregos e portanto há um mito para explicar porque a Oliveira é tão importante para os helenos.
Arroz à Grega
Reza a lenda que os fundadores de uma cidade, que viria a ser a mais importante da Grécia Antiga, precisavam de um deus para protegê-los, mas não haviam se decidido a quem iriam dedicar suas oferendas. No final dois Deuses se apresentaram aos mortais na disputa pela primazia da cidade: Poseidon e Athena. Os dois deveriam dar um presente aos mortais, um que fosse muito útil a eles e que os convencesse a aceitá-lo como seu protetor. Poseidon, seguro de si, pegou seu tridente e atirou-o no solo fazendo jorrar uma vigorosa fonte de água doce, um bem muito precioso. Os mortais ficaram maravilhados e alguns já declaravam a vitória, então Atena se aproximou. Ela ajoelhou-se e plantou uma semente, que graças a seu poder divino nasceceu, cresceu e transformou-se numa árvore cheia de pequenos frutos carnudos e saborosos. Então explicou aos mortais que dessa árvore eles poderiam tirar não só seu sustento, mas também o óleo e por ser uma árvore poderiam reproduzí-la o quanto quisessem. Enfim, vitória incontestável. Furioso por ser derrotado por sua sobrinha, Poseidon destruiu a fonte e causou um maremoto tentando destruir a cidade. Mas ela pertencia a Athena agora e tão logo percebeu que o tio iria fazer correu para o papai Zeus e pediu ajuda. Zeus jogou panos quentes, Poseidon saiu enfurecido e a cidade tornou-se Athenas.

Mas não são só os ocidentais que sabiam cozinhar coisas gostosas.
Hoje é um fenomeno mundial, mas a culinária Chinesa tem Milênios de existência. Por ser um país enorme desde sempre e como sempre muito tradicional, por conta da característica chinesa de fazer tudo conforme a tradição a culinária é dividida em 4 grandes escolas de cozinha. Essa divisão é levada tão a sério quanto as divisões de artes marciais dos monges Shaolin (norte e Sul) As cozinhas chinesas são a do norte, cujo prato mais famoso é o Pato Lacado(Tradicionalmente meticulosa com os ingredientes e carregada no sal); a do sul é exótica, famosa pelos cozidos com carne de cobra e pela alta temperatura dos cozimentos. O prato mais famoso é o frango zhuzhou de Foshan; a do oeste tradicionalmente picante, prato mais famoso é o queijo de soja com pimentões; e finalmente a do leste, a mais nova delas, basicamente voltada para o mar, cujo principal prato são as ovas de carangueijo com barbatans de tubarão.
Por ser um país fechado e tradicional a China conseguiu manter sua culinária bastante peculiar. E como não poderia deixar de ser, vou deixar aqui a receita do mundialmente famoso Pato de Pequim, para quem quiser tentar.

Pato de Pequim
Ingredientes: 1 3/4 kg de pato, 1 colher(es) (sopa) de mel, 3 colher(es) (sopa) de molho de soja, 1 colher(es) (sopa) de óleo de gergelim, quanto baste de colorau e 2 colher(es) (sopa) de água.


Coloque o pato em um escorredor de macarrão na pia. Despeje água fervendo por cima e repita o procedimento por mais 2 vezes. Pendure o pato de um dia para outro em lugar arejado e frio ou coloque sobre a grade da geladeira. Na manhã seguinte, em uma tigela pequena, misture o mel, o shoyu, o óleo de gergelim e o corante. Coloque o pato sobre uma grade em uma assadeira. Pincele por igual com a mistura de mel, reservando 1 colher (sopa), e deixe por pelo menos 1 hora. Pré-aqueça o forno a 200° C. Junte a água à mistura de mel restante e despeje através da cavidade do pato. Com espetos de carne ou palitos de madeira, feche a abertura. Asse o pato por 1 hora e meia, até que, espetando com um palito na junção da coxa, escorra um líquido claro. Retire o pato do forno e deixe em lugar aquecido por 10 minutos antes de trinchá-lo.

Sushi
Outro país tradicionalmente famoso por sua culinária exótica e peculiar é o Japão. Pode-se pensar, erroneamente, que a culinária japonesa é saudável porque eles viviam numa ilha e portanto não tinham espaço suficiente para criar animais de grande porte como bois e búfalos para alimentar a população, restando portanto buscar a comida no mar. Isso não é totalmente verdade. Na realidade a culinária japonesa se desenvolveu da forma como é por conta da imposição religiosa. Num passado remoto um dos governantes japoneses se converteu ao budismo, que pregava uma forma restrita de alimentação, excluindo a carne animal do cardápio de seus fieis. Assim o povo teve de se adequar àquela nova normal social e com isso tiveram de ser criativos para buscar sua nutrição. Quando o tempo passou e os antigos preceitos foram retomados a cultura culinária do arquipélago já havia mudado, o povo se acostumara com aquele tipo de comida que casava bem com a situação geográfica em que viviam e ai nasceu a exótica e saudável culinária japonesa. Por ser um arquipélago bastante fechado, o Japão preservou sua cultura tanto social quanto culinária bem distante das influências de outros países mais poderosos, como a China por exemplo o que criou nos japoneses um forte sentimento de nacionalidade ligado a essas peculiaridades, que vai desde a forma como tratam a comida até a forma ritual de comer.

E na Europa?
Bem a Europa como sabemos é um caldeirão de civilizações. Uma encruzilhada, assim como o Oriente Médio. Portanto a culinária Européia foi influenciada por diversas tradições. Da mediterrânea, importada diretamente da Grécia, que por sua vez era porta de entrada das cozinhas e ingredientes de todo o mundo (Inclusive da China, embora o contato entre eles se desse através dos povos que viviam entre eles e nunca diretamente). Basicamente, a culinária européia continental demorou a atingir o patamar de requinte que consideramos hoje. Na idade média nobres comiam basicamenta carne e plebeus toda a sorte de coisas que pudessem plantar. Isso normalmente fazia dos plebeus pessoas mais saudáveis, embora as condições de vida que levavam não eram nem de longe propícias para essa saúde se demonstrar em seu pleno vigor. Os povos que destruíram o império romano trouxeram suas próprias receitas e costumes, agregaram ao jeito romano de ser e construíram o que viria a ser no futuro o jeito europeu de cozinhar. Aqui cabe algumas ressalvas.

Espanha, Portugal e a península Itálica sofreram uma massiva influência árabe em suas culinárias. Que por consequência eram trazidas do oriente pelo vasto território que os muçulmanos dominava na época. Na Gália Germania, Britania e no norte da Europa predominavam os costumes miscigenados de bárbaros e romanos. E é na Gália, que mudou de nome por conta dos bárbaros que a tomaram para si (os Francos, portanto a França) que a culinária se tornará uma arte com A maíusculo. Mas isso só no séculos XVIII e XIX.

Salada Maia
Outro ingrediente que impulsionou a culinária mundial foi o encontro das Américas por Colombo. De longe a maior contribuição que os povos nativo americanos deram ao resto do mundo (Com excessão das Américas é claro) foi sua culinária e os ingredientes exóticos que só existiam por aqui. Tomates, Abacates, Abacaxis, Batatas, Milho, Canela, Maracujás, etc. Os europeus não sabiam o que era milho antes de 1492. Tomates? nem imaginavam o que poderia ser. E batata, a grande salvadora da europa nos tempos de fome? Devem aos peruanos.
Pode-se seguramente afirmar que esse período marcou a primeira globalização da humanidade. A Globalização Gastronômica. Em pouco mais de um século milho era plantado na África, Tomates na Itália e Arroz nas Américas. Milhares de receitas surgiram e se adaptaram ao longo do mundo todo. E na Europa fundiram-se dois ingredientes que dariam luz ao doce mais delicioso do mundo. O Chocolate!
Hmmmm!!!!
A bem da verdade Chocolate (Xocoatl, em nahuatl) foi invenção dos povos que habitavam o México e a América Central antes da chegada dos Espanhóis. Mas essa iguaria era uma bebida ritual e amarga em nada parecida com o chocolate que conhecemos hoje. Devemos a gloria dessa delícia aos mosteiros espanhóis que combinaram a bebida amarga ao açúcar (Vindo das canas de açúcar originárias da Índia!) e criaram o chocolate doce que conhecemos hoje. Com o café foi a mesma coisa, embora este tenha vindo da África (Na Etiópia mais precisamente) e que também foi combinado ao açúcar indiano para produzir a bebida mais apreciada dos trabalhadores compulsivos!

Ratatouille
Mas foi na França de Louis XIV que a gastronomia deu um salto de simples cozinha para arte do prazer e do pecado. O Rei Sol, que afirmava ser o próprio estado foi um dos principais entusiastas do desenvolvimento de uma culinária sofisticada e exclusiva. Suas sementes seriam colhidas no século XVIII quando foi inaugurado o primeiro Restaurante Moderno do mundo. Os Parisienses inventariam a idéia de comer socialmente por prazer de estar em um lugar apenas para aquilo: se divertir comendo.
A culinária Francesa dispensa elogios e comentários, pois foi a pioneira no ramo e abriu as portas para o resto da culinária mundial apresentar suas delícias. Antes das guerras, quando os países procuravam afirmar sua identidade através das diferenças, surgiram as culinárias nacionais e os pratos típicos de cada país, como a afirmativa de que a Feijoada é Brasileiríssima (o que é uma tremenda mentira é um prato típico portugues, provavelmente inspirado no cassoulet frances, e que existe em todos os países colonizados por portugueses. A diferença é que só no Brasil se faz feijoada com feijão preto, o que garante um sabor único ao prato).

Hehehe...
Enfim, a culinária requintada começou a dar lugar ao estilo de vida agitado e surgiram os famigerados fast foods americanos. Embora tentem combinar elementos saborosos num estilo industrial e imediatista, típico de nosso tempo, essas redes tiram aquilo que desde tempos imemoriais a humanidade religiosamente repetia com prazer: O deleite de aproveitar a comida com os entes queridos, sem se preocupar com o tempo ou as angústias, deixando literalmente os leões e lobos pra lá.

Fontes:
http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/mulher-culinaria-francesa/culinaria-francesa-1.php
http://cybercook.terra.com.br/receita-de-pato-de-pequim.html?codigo=12785
ROCHA, J. M. de S., Civilização e Culinária: Mesopotâmia (Antiga Pérsia e Região atual do Iraque)