Então começamos...
Bem, com alguns anos de atraso resolvi finalmente ceder a corrente de meu tempo e deixar minha marca na história digital. Pretensioso? Talvez, mas como bom históriador sei que qualquer relato, mesmo que de alguém totalmente insuspeito como eu pode ter alguma relevância daqui há... quem sabe 100 anos?
Devo aqui, no início dessa longa postagem (pois sofro do mal de ser megalomaníaco), expressar as devidas honrarias àquelas que foram as responsáveis por meu animo a iniciar essa empreitada, que espero seja duradoura e prazerosa. Minha esposa Paula, que para minha surpresa rendeu-se aos encantos da internet (algo impensável anos atrás) iniciando seu incrívelmente promissor blog de organização A arte de organizar e nossa grande amiga Édina, que também tem um blog fascinante o Maria Pimenta, que estoicamente ao lado de Antônio (Seu marido) aguentam minhas intermináveis esplanações sobre os mistérios da história em nossas divertidas incursões pelos bares de nossa calorosa cidade (Os quais normalmente ajudamos os garçons a fecharem as portas lá para tantas horas da noite). Também não poderia me esquecer de meu amigo e sócio Jessé Suursoo, que sempre me incentiva nas minhas frustradas aventuras no ramo da literatura (um dia quem sabe escrevo algo que nos traga alguma grana). E claro, a meus "amigos e amigas imaginários(as)", Ricardo Dias, Harumi Odagiri e Paulo Koto, a quem conheço há quase 10 anos e nunca os vi pessoalmente. Que os deuses salvem a Internet.
Mas chega de delongas. Vamos ao que interessa, o Blog!
Em primeiro lugar gostaria de explicar o nome. Ateneu, hoje em nossa amada lingua portuguesa é comumente associado a escola. Deveras, é isso mesmo. E a origem desse nome remonta a Roma. No ano 135 d.C. o imperador romano Adriano criou os fundamentos daquilo que daria origem aos centros de saber que hoje conhecemos como escolas, universidades etc. E ele deu o sugestivo nome ao lugar de "Atheneum", que significa nada mais nada menos do que "A casa de Athena". Nesse lugar, os estudiosos poderiam escrever, ler e discutir idéias em público, recenbendo críticas ou elogios e normalmente eram recompensados por isso. Lembra um blog não?
Mas qual é a razão de se escrever esse blog? Bem, como disse, em nossas conversas de botequim, percebi que há sim um real interesse pelo passado, histórico ou mitológico e que nem todos tem paciência ou vontade ou mesmo tempo para buscar. Portanto, coisas muito interessantes que a academia acaba descobrindo se restringe a esse circulo de pesquisadores e o público interessado fica excluído de saber, algo tão importante para nós seres humanos. Minha intenção é tentar trazer um pouco disso que sei e espalhar para o maior número de pessoas, para que assim essas coisas interessantes de nosso passado possam se disseminar aos quatro ventos, alimentando uma conversa mais rica. Afinal, papo cabeça pode sim ser tão interessante quanto discutir futebol, ou muito mais interessante do que discutir a vida de alguém que você nem conhece e nem gostaria de conhecer, mas foi obrigado por força da caixa mágica que habita sua casa e o obriga a prestar tributo todos os dias quando passa por ela.
Assim Pessoal aqui vou eu! Encher a cabecinha de vocês com essas coisas de gente morta e ocupar o tempo de vocês com o passado, para quem sabe despertar em vocês a centelha do reconhecimento de nossas ações no presente.
E para minha primeira postagem, como não poderia deixar de ser, vou prestar um tributo à Ela, provavelmente a mais conhecida, admirada e cultuada deusa grega do mundo antigo, patrona desse blog e de meu interesse pela ciência. Aquela cuja admiração resistiu ao tempo e a perseguição religiosa e que mesmo em tempos de domínio rigoroso do cristianismo, conseguiu inspirar os artistas a enfrentar o perigo da fogueira. E que me enviou um sinal através de uma insuspeita visita a banca de jornal. Como não sou bobo de não atender o chamando dos deuses quando solicitado ai vou eu!
"Athena"
Quando destronou seu pai, Chronos o titã devorador de filhos, Zeus foi informado pelo oráculo, o lugar onde o futuro era revelado, que assim como ocorrera com seu pai, ele também seria destronado por seus filhos. Primeiro viria a jovem de olhos brilhantes cuja inteligência se equivaleria a dele. Depois o jovem que governaria Deuses e Homens. Apavorado, Zeus virou-se para sua primeira esposa, a titã Métis, a mais sábia entre Deuses e homens e elaborou um plano para que aquela tragédia descrita pelo oráculo não recaísse sobre ele. Ele propôs um jogo com a esposa, ela deveria ficar bem pequenina. Obedecendo ao marido a pobre Métis acabou engolida por Zeus, que julgou ai ter posto um fim no seus problemas. Contudo nem os Deuses estão livres dos ditames do destino.
Um dia, padecendo de horríveis dores de cabeça, Zeus procurou um de seus filhos, o Coxo, feio mas valoroso Hefestos, deus dos ferreiros e do fogo, e pediu que ele lhe partisse a cabeça para aliviar aquela dor. A princípio o filho hesitou. Mas como quando Zeus quer algo, Zeus consegue ele cumpriu seu designio. Imediatamente da fenda, saltou uma jovem Deusa completamente vestida e adulta. Portando um elmo de guerra e reluzindo o mundo com seus brilhantes olhos acinzentados que lembravam os de uma coruja. Assim nasceu Athênê, para nós Athena.
O que difere Athena de outras deusas do mundo antigo é sua decisão de manter-se casta. Não por um motivo qualquer, mas com a intenção clara de não pretencer tão somente a esfera feminina da sociedade. Athena é uma personagem ambigua. Ao mesmo tempo em que é a deusa da Guerra Justa, ou seja, daquilo que a guerra serve: levar a paz; o oposto de seu irmão e eterno rival Ares. É também a deusa dos trabalhos elaborados, do saber, da justiça, etc. Ela é admirada tanto por homens quanto por mulheres. E essa ambiguidade é uma metáfora para demonstrar a transformação que a sociedade antiga estava passando. Antes, a divindidade era associada a maternidade e o poder da mulher era muito grande. Contudo, quando os homens passaram a dominar as esferas de poder, os deuses deixaram de ser dinvindades atreladas a fertilidade e passaram a se tornar deuses guerreiros e violentos. Athena é a representação dessa virada de mesa. Os homens a idolatram por ser corajosa e honrada (valores que tinham como os mais altos em sua sociedade) e as mulheres admiravam sua benevolência e competência em tudo o que fazia. Mas por trás disso existia a questão da castidade. Afinal, Athena era casta pois se não o fosse seria apenas uma "mulher comum", que poderia ser possuída por qualquer homem e isso era um sinal de fraqueza. Assim, nota-se que mesmo por trás desse exemplo incrível de feminilidade, que inspirará as mulheres milênios mais tarde a buscar seu lugar de direito, há o estigma do machismo que começa a impor-se sobre as mulheres na antiguidade.
"A queridinha do Papai"
Há um fato curioso na história dessa deusa. Zeus, apesar dos dizeres do oráculo, tem para com Athena o amor incondicional de um pai babão. Tudo o que Athena quiser ela conseguirá do velho pai. Mas não como uma menina mimada e talvez seja aqui um dos exemplos de como o mito ajudava na educação das crianças na antiguidade. Athena era a filha que todo pai gostaria de ter. Era independente, valente, obediente, competente, esforçada, leal e acima de tudo virgem. Qual pai na Terra não gostaria de ter uma filha assim?
Contudo Athena era uma irmã bastante encrenqueira. Ares que o diga. Há diversos relatos na Teogonia e na Iliada em que os dois irmãos se enfrentam, inclusive saem no braço, principalmente quando estão disfarçados no campo de batalha, coisa que gostavam de fazer com frequência. Na Iliada, Athena garante a um herói, Diomedes o poder de ver os deuses em sua real forma no campo de batalha e o ajuda a tirar Ares da luta, desviando a flecha do deus e fazendo com que a do mortal o atinja em cheio na barriga. Hera, a mãe de Ares o leva dali. Furioso o deus vai até Zeus, que se mantém neutro na questão (Athena luta pelos gregos, Ares pelos Troianos) e reclama:
"Pai Zeus, vossa indignação não fará cessar atos tão violentos? Continuaremos, nós deuses, a sofrer tão cruelmente nas mãos uns dos outros quando auxiliamos os homens? Estamos todos em luta porque vós sois pai daquela tola e violenta jovem, cuja mente está sempre voltada para atos culposos. Todos os outros deuses do Olimpo são obedientes e sujeitos a Vós, cada um de nós; mas a ela Vós não ofereceis nenhum freio, nem em palavras nem em ações; ao contrário, ela faz o que bem entende... Incentivou Diomedes, filho de Tideu, a ferir-me, embora eu seja um deus, e só escapei graças a meus velozes pés, ou estaria agora entre as pilhas de mortos".
Como não poderia deixar de ser. Zeus deu um sermão em Ares. Dizendo que era ele que costumava arrumar confusão com os outros deuses e que deveria por-se em seu lugar. Furioso o deus da guerra se curou e voltou ao conflito, com a intenção explicita de se vingar da irmã. Já chegou atirando sua lança contra Athena, que defendeu-se com o aegis, o escudo de seu pai, indestrutível contra tudo e todos; e contra atacou com uma pedrada no pescoço do irmão, proferindo a seguir:
"Tolo, você ainda não aprendeu quão mais poderosa do que você eu consigo ser?"
"Athena Sufragium"
Falar sobre Athena levaria várias e várias páginas. Contudo, sou informado por minha esposa agora que um Blog não deve ser TÃO grande assim. Portanto, terei de restringir meu impulso e encurtar a história. Athena apesar de poderosa e justa era implacável, como deveria se esperar da deusa que representasse a justiça. Nem sempre seus julgamentos podem ser considerados os mais justos. Normalmente, quando versavam sobre um mortal e um Deus, o castigo maior era sempre para o mortal. Medusa, era uma belíssima jovem, que foi seduzida por Poseidon, deus dos mares e tio de Athena, os dois mantinham uma relação de rivalidade, de menor escala, normalmente disputando o patronato das cidades gregas. Afinal os Gregos eram (e segundo um amigo grego) são muito ligados ao mar e por isso o Deus dos Mares era tão temído quanto Athena era amada. O azar de Medusa foi deixar-se seduzir no templo de Athena, o que era um pecado para qualquer mortal. Não se podia nem dar a luz ou morrer no templo de um deus, quanto mais ficar de fricote. O resultado nós já sabemos. A deusa a transformou num monstro e não contente, depois ajudou o herói Perseu a decaptá-la. Em alguns casos a sua implacável justiça não se restringia apenas ao algoz. Como no caso da queda de Troia, quando o herói Ajax invadiu o templo de Athena na cidade e estuprou a princesa Cassandra que estava agarrada a imagem da Deusa. Nenhum grego o impediu e por isso Athena (Muito mais furiosa por terem violado o templo do que a pobre mulher) atendeu as súplicas da princesa e pediu a Posseidon que castigasse todos os gregos que estavam ali. Ajax enlouqueceu e matou toda sua tripulação e os outros heróis ficaram vagando pelo mar mediterrâneo por décadas. Entre eles Ulisses, por quem Athena nutria uma afeição pouco habitual e é o herói da Odisséia. Pois nele ela enxergava suas próprias características. A inteligência e a astúcia para vencer a brutalidade e os perígos.
"Todos temos segredos"
O barato da mitologia é que os Deuses são uma forma de representação dos valores e vícios humanos. Com a austera Athena não poderia ser diferente. Apesar de todas suas qualidades, há um evento pouco esclarecido na mitologia acerca dessa deusa. Ela mesmo sendo virgem, teve um filho. (Qualquer semelhança com outra virgem não é mera coincidência, afinal, a cultura se espalha e se molda de acordo com as situações da sociedade que a recebe.) Erictheon, era o nome do rebento e a história para seu nascimento mais aceita é a seguinte: Hefesto era esposo de Afrodite. O casamento dos dois fora uma piada de mau gosto de Zeus para com a orgulhosa Deusa da Beleza. Forçada a se casar com o mais feio dos deuses. Claro, Afrodite não estava nem um pouco interessada em fidelidade e traía o pobre descaradamente com quem ela bem entendesse. E o principal amante era Ares. Hefesto descobriu, fez uma rede mágica tão fina quanto fios de cabelo e tão resistente quanto aço e esperou que os amantes se entregassem ao sexo para aprisioná-los e depois mostrar a pouca vergonha pra todos os demais seres do Olimpo, a morada dos deuses, que não é o paraíso, para os gregos o paraíso são os Campos Elíseos. Então, arrasado pela vergonha ele foi atrás de Athena, querendo desposá-la, pois devia acreditar que ela não o trairia. Virgem convicta ela resistiu violentamente aos gracejos do deus e o semem dele caiu na terra. Envergonhada, sabe-se lá por que motivo, Athena cobriu a terra e dela nasceu Erictheon. Ela então pegou a criança. Colocou em uma caixa e levou para uma familia de Athenas. Mas disse que ninguém poderia ver o que tinha dentro. Claro que desobedeceram! E como punição ela fez com que os curiosos se matassem. Então levou o filho adotivo para o Parthenon, ("O templo da Virgem" do qual vou falar sobre em postagens futuras) e o criou lá até que se tornasse um jovem forte e desafiasse o rei da cidade, vencendo-o e coroando-se assim o rei de Athenas (Para os gregos Athinai, que significa Cidade de Athena).
Enfim!
UFA!
Espero que não tenha sido demasiado chato ler tudo isso. Tinha muito mais. Contudo, não posso abusar da paciência de vocês.
No próximo post vamos dar um salto nos hemisférios e falar de outra figura importante da mitologia e da história: "Quetzalcoatl, o deus cultuado do México ao Peru"
Fontes
Revista História Viva: Deuses da Mitologia 5: Atena.
Bulfinch,T. O Livro de Ouro da Mitologia. - Ediouro
Victoria, L. A. P. Dicionário Básico de Mitologia - Ediouro
Mestre Fernando,
ResponderExcluirSerei a primeira a comentar, hehehe, agradecemos imensamente a honraria e saiba que ficamos felicíssimos em saber do seu blog.
Com certeza seremos seus seguidores!
Parabéns amigo, e sucesso, aliás, parafraseando minha amiga e sua esposa: sorte, saúde e sucesso!
Abraços
Édina e Antonio
Olá Fernando,
ResponderExcluirJá conhecia a história de Athena - mais do que a maioria que acha que ela é uma personagem de Cavaleiros do Zodíaco -, mas havia algumas coisas que não sabia e gostei de conhecer, como por exemplo a história de seu "filho". Também foi um deleite lembrar-me da leitura da Ilíada, bela obra. Ainda preciso ler a Odisséia.
Como sugestão de entusiasta, você poderia discorrer mais sobre os aspectos obscuros da mitologia, como por exemplo o fato de Athena ter nascido da cabeça de Zeus, ou do Pégaso ter nascido do sangue da Medusa. Há uma explicação cultural, analítica ou psicológica pra isso? Sempre tive grande interesse nesta questão.
No mais meus parabéns, adorei a iniciativa e certamente acompanharei os posts. Espero ansiosamente pelo próximo, Quetzalcoatl, figura pela qual tenho bastante curiosidade. Não o conheço muito, mas já me deparei com ele em minhas pesquisas literárias por aí afora.
Grande abraço.
Ricardo Dias
Opa! Comentários!
ResponderExcluirObrigado Edina. Espero não decepcionar vocês. Inspirado na nossa funesta conversa de ontém no Bar, no terceiro post vou abordar as diferentes visões a respeito do mundo dos mortos. hehehe.
Ricaro, valeu camarada.
Quanto as questões. Sim, existe uma esplicação para os dois fatos. O primeiro é que Athena nasceu da cabeça de Zeus pois ela representa a Inteligência dos Deuses, assim ela seria a representação da mais pura forma da capacidade cognitiva dos homens, a pura razão.
Em relação a Medusa. Nos lembremos de que Poseidon seduziu a jovem e bela Medusa ainda humana no templo de Athena, o que significou a ruína da mortal. O cavalo na Grécia Antiga era associado a figura do deus dos mares. Assim o Pégaso nascer do sangue da cabeça decepada da Medusa é uma analogia a essa união com Poseidon. A Medusa em si contudo é uma metáfora muito elucidativa. Ela representa a soberba e o mal que ela causa aqueles que são consumidos por ela. Medusa, em sua soberba acreditava ser mais bela que as demais deusas. Athena então a castigou transformando-a na mais horrível das criaturas e cujo olhar mortal petrificaria tudo aquilo em que pousasse. Assim a Medusa estaria condenada a jamais ser vista ou admirada por mais ninguém. Condenada para sempre a solidão e a infelicidade. Mas o castigo não se restringiu somente a Medusa, mas também a suas duas irmãs. Contudo as demais Górgonas, eram imortais condenadas a viver como monstros pelo resto das vidas, embora não tivessem o poder de petrificar os que as vissem. Esse castigo foi uma forma de demonstrar que para os deuses, não basta simplesmente não executar um ato, mas ser omisso quando se pode impedí-lo também é passível de castigo.
No futuro, pretendo voltar a falar sobre as peripécias de Athena. Há muitas histórias que a envolvem, contudo não posso colocar tudo, ou vou desanimar quem não gosta de ler muito hehehehe!
Rapaz...tu escreve bem hein!
ResponderExcluirparabéns pelo blog.
Red, meu caro amigo! Parabéns pelo blog! E obrigada pelas considerações!
ResponderExcluirSempre arepndendo muito com vc ;)
Mais uma vez, parabéns!
Vlw galera.
ResponderExcluirContinuem visitando e comentando.
Se tiverem algum assunto que gostariam de ver no blog ou alguma curiosidade a respeito de mitologia ou história é só postar!
E ai fernando, agora que consegui ler "por inteiro".
ResponderExcluirCara, muito legal! Apesar de mitologia já ser interessante por si só, mas você conseguiu escrever de uma maneira bem "ilustrada".
Eu como bom fã de psicologia e mitos, não posso deixar decomentar que, talvez um dos papéis mais interessantes da mitologia, de seus simbolos, são representar a "alma" humana. Externar os sentimentos, dar formas a imaginação, e um sentido mais "palpável" a energia que flui da nossa interioridade.
Meus parabéns!